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Decreto de Trump que nega cidadania a bebês de imigrantes ilegais fere Constituição

No primeiro dia na Casa Branca, o presidente norte-americano Donald Trump adotou diversas medidas polêmicas, incluindo um decreto, contrário à Constituição, que nega cidadania a filhos de imigrantes ilegais nascidos no país. 

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Contra a medida, procuradores-gerais de 18 Estados e associações acionaram a Justiça Federal.
Procuradores
A queixa dos procuradores foi apresentada ao tribunal distrital Federal em Boston. Conforme noticiado pelo jornal Estadão, eles argumentam que a tentativa de Trump de limitar a cidadania é extrema e radical.
“Os presidentes são poderosos, mas ele não é um rei. Ele não pode reescrever a Constituição com um toque de caneta”, afirmou Matthew J. Platkin, procurador-geral de Nova Jersey.  
O procurador-geral de Connecticut, William Tong, cidadão americano por direito e o primeiro procurador-geral sino-americano eleito no país, declarou que a medida o atinge diretamente.  
“A 14ª Emenda diz o que significa, e significa o que diz — se você nasceu em solo americano, você é um americano. Ponto final. Ponto final”, disse. “Não há debate legal legítimo sobre essa questão. Mas o fato de Trump estar completamente errado não o impedirá de infligir danos sérios agora mesmo a famílias americanas como a minha”, completou.  
Associações civis
A ACLU – American Civil Liberties Union de New Hampshire, Maine e Massachusetts, a Asian Law Caucus, a State Democracy Defenders Fund e a Legal Defense Fund, entre outras associações defensoras dos direitos dos imigrantes nos EUA, ajuizaram, também, uma medida na Justiça norte-americana contra o decreto. 
Na ação, elas acusam o governo de violar a Constituição, contrariar a intenção do Congresso e ignorar precedentes históricos estabelecidos pela Suprema Corte.
“Negar cidadania a crianças nascidas nos EUA não é apenas inconstitucional — é também uma rejeição imprudente e implacável dos valores americanos. A cidadania por direito de nascença é parte do que torna os Estados Unidos a nação forte e dinâmica que é. Esta ordem busca repetir um dos erros mais graves da história americana, criando uma subclasse permanente de pessoas nascidas nos EUA que são negadas de todos os direitos como americanos. Não deixaremos esse ataque a recém-nascidos e futuras gerações de americanos passar sem contestação. O exagero do governo Trump é tão flagrante que estamos confiantes de que, no final das contas, prevaleceremos”, declarou Anthony D. Romero, diretor executivo da American Civil Liberties Union.

Veja a petição (em inglês).

O que diz o decreto? 
A ordem executiva intitulada “Protegendo o Significado e o Valor da Cidadania Americana” busca redefinir a interpretação da Cláusula de Cidadania da 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, visando encerrar a concessão automática de cidadania para filhos de imigrantes indocumentados e de imigrantes legais temporariamente presentes nos EUA, como aqueles com visto de estudante, trabalho ou turismo.
Especificamente, a ordem estabelece que não serão considerados cidadãos americanos ao nascer indivíduos nascidos em duas situações:

Quando a mãe estava ilegalmente presente nos EUA e o pai não era cidadão americano nem residente permanente legal no momento do nascimento.
Quando a mãe estava nos EUA em status temporário (por exemplo, com visto de estudante, trabalho ou turismo) e o pai não era cidadão americano nem residente permanente legal no momento do nascimento.

A ordem especifica que as disposições se aplicam apenas a pessoas nascidas 30 dias após a data da ordem, ou seja, a partir de 19/2/2025.

O que diz a Constituição dos EUA?
A cidadania por direito de nascimento garante que qualquer pessoa nascida nos Estados Unidos seja cidadã, independentemente do status de imigração de seus pais.
Isso significa que pessoas no país com visto de turista, outro tipo de visto ou mesmo de forma irregular podem ter filhos que sejam cidadãos americanos, caso nasçam em solo norte-americano.  
A 14ª emenda da Constituição do país estabelece: 
“All persons born or naturalized in the United States, and subject to the jurisdiction thereof, are citizens of the United States and of the State wherein they reside. No State shall make or enforce any law which shall abridge the privileges or immunities of citizens of the United States; nor shall any State deprive any person of life, liberty, or property, without due process of law; nor deny to any person within its jurisdiction the equal protection of the laws.”
Em tradução literal, a emenda prevê que:
“Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos, e sujeitas à sua jurisdição, são cidadãs dos Estados Unidos e do Estado em que residem. Nenhum Estado deverá criar ou aplicar qualquer lei que restrinja os privilégios ou imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem deverá qualquer Estado privar qualquer pessoa de sua vida, liberdade ou propriedade, sem o devido processo legal; nem negar a qualquer pessoa sob sua jurisdição a igual proteção das leis.”
Jurisprudência
Segundo documento do American Immigration Council, o conceito de cidadania baseada no local de nascimento está estabelecido há mais de 400 anos, especialmente no âmbito do direito consuetudinário inglês.
O caso Calvin’s Case foi uma decisão jurídica inglesa de 1608 que influenciou a compreensão americana sobre a cidadania baseada no local de nascimento. Esse caso determinou que uma criança nascida na Escócia seria considerada súdita inglesa sob o direito consuetudinário e teria direito aos benefícios das leis inglesas.
O texto ainda relata que, uma ação de 1844, ajuizada em Nova York, Lynch v. Clarke, foi um dos primeiros a abordar o conceito de cidadania baseada no local de nascimento nos Estados Unidos.
Neste caso, Julia Lynch nasceu em Nova York, filha de dois pais irlandeses que eram visitantes temporários nos Estados Unidos. Pouco depois de seu nascimento, Lynch e sua família retornaram à Irlanda sem declarar intenção de se naturalizar. Apesar de ter permanecido na Irlanda por vinte anos após seu nascimento, um tribunal dos EUA utilizou o princípio do jus soli (cidadania baseada no local de nascimento) para decidir que ela era cidadã americana desde o nascimento.
“Não posso ter dúvidas de que, pela lei dos Estados Unidos, toda pessoa nascida dentro dos domínios e sob a lealdade dos Estados Unidos, qualquer que fosse a situação de seus pais, é cidadã nato”, escreveu, em 1844, o juiz Lewis Sandford. 
No entanto, a 14ª Emenda foi adotada em 1868, após o fim da Guerra Civil. A 13ª Emenda havia abolido a escravidão em 1865, enquanto a 14ª resolveu a questão da cidadania dos ex-escravos libertos nascidos nos Estados Unidos.
Decisões anteriores da Suprema Corte, como o caso Dred Scott v. Sandford de 1857, haviam determinado que afro-americanos nunca poderiam ser cidadãos dos EUA. A 14ª Emenda anulou essa decisão.
Em 1898, a Suprema Corte dos EUA confirmou que a cidadania por direito de nascimento se aplica aos filhos de imigrantes no caso Wong Kim Ark v. United States.
Wong, filho de imigrantes chineses, tinha 24 anos e nasceu nos EUA, mas foi impedido de reentrar no país após uma viagem à China. Wong argumentou com sucesso que, por nascer nos EUA, o status de imigração de seus pais não afetava a aplicação da 14ª Emenda.

Veja a matéria original.

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